Breves comentários sobre a reforma da previdência

PARTE I

Sumário: 1 Considerações preliminares. 2 Capítulo I Das alterações na Constituição. 3 Capítulo II – Das alterações no Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. 4 Capítulo III – Das regras de transição aos regimes próprios de Previdência Social. 5 Capítulo IV – Disposições transitórias relacionadas aos regimes próprios de previdência social. 6 Capítulo V – Das regras de transição relacionadas ao regime geral de previdência social. 7 Capítulo VI – Disposições transitórias relacionadas ao regime geral de previdência social. 8 Capítulo VII – Disposições transitórias à assistência social e a outras matérias. 9 Capítulo VIII – Disposições finais.

 

1 CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES

          Os especialistas da matéria foram surpreendidos com o tamanho da proposta de Reforma Previdenciária, PEC nº 6/2019, enviada dia 20 de fevereiro de 2019 à Câmara dos Deputados pelo Presidente Jair Bolsonaro.

Contém quatrocentas normas entre artigos, parágrafos e incisos, sem contar as infindáveis alíneas. É dezena de vezes maior do que a Constituição Americana que contém apenas vinte e seis artigos, além da 5ª Emenda.

O Ministro Paulo Guedes, um estadista com visão macroeconômica, pretendeu solucionar todos os problemas socioeconômicos no bojo da proposta de reforma previdenciária, como se este setor fosse o único responsável pelo déficit público que está crescendo perigosamente. Por isso, a mídia já fala em jabutis colocados nos textos da reforma.

Para lograr a rápida aprovação que o governo pretende e a sociedade espera, o que seria muito bom para o País, deveria a proposta ter se limitado aos pontos essenciais da reforma adiantados pelo governo: (a)  aumento da idade mínima para mulheres (62 anos) e para os homens (65 anos) para se aposentarem; (b) aumento do tempo mínimo de contribuição de 15 para 20 anos para a aposentadoria por idade; (c) tempo de contribuição de 40 anos para aposentadoria com proventos integrais; (d) redução de benefícios acumulados (proventos/pensão); (e) inclusão de regras específicas para o sistema de capitalização; além de normas genéricas sobre o regime de transição. Enfim, seria uma proposta enxuta mexendo o menos possível nas normas constitucionais em vigor.

Porém, a proposta apresentada altera inúmeros dispositivos da Constituição Federal (arts. 22, 37, 38, 39, 40, 42, 109, 149, 167, 194, 195, 201, 203, 239, 251), além de modificar dispositivos do ADCT. Incidindo na tradicional confusão entre previdência social, de caráter contributivo, e assistência social, que como o próprio nome indica, tem caráter assistencial, a proposta de reforma incursiona no campo da assistência aos carentes que devem ser atendidos exclusivamente com os recursos do Tesouro. É essa confusão que tem levado a previdência social a suportar um ônus que não é dela, agravando o montante do déficit previdenciário. Criou-se, desnecessariamente, mais um foco de resistência parlamentar ao prever, contra expresso texto constitucional em vigor, uma quantia insignificante de R$400,00 a título de Benefício de Prestação Continuada – BPC – para os idosos, matéria completamente estranha ao campo da previdência social. Aliás, essa matéria é tipicamente de legislação ordinária, do contrário o “Bolsa Família”, também, deveria ter status constitucional (ver inciso V, do art. 203 da CF). Por isso, a própria previsão atual da garantia de um salário-mínimo como consta do inciso V, do art. 203 da CF deveria ser suprimida deixando que a legislação infraconstitucional defina o valor do benéfico mensal ao idoso que comprovar o estado de miserabilidade. No mais, a PEC avança nas áreas de direito tributário, de direito administrativo, de direito financeiro, de direito judiciário e contém normas excessivamente repetitivas, trazendo para o bojo da Constituição preceitos despidos de caráter constitucional, como aquelas concernentes a dispositivos transitórios e regras de transição, elaboradas de forma minudente e com inusitado sadismo burocrático. Essas minúcias se assemelham às instruções normativas da Receita Federal acerca da legislação do PIS/COFINS recheadas de normas casuísticas contendo exceções dentro das próprias regras excepcionais. Em compensação deixou um imenso espaço a ser preenchido, corretamente, pela lei complementar, abrangendo, às vezes, matérias que deveriam figurar no texto constitucional, como aquela de define o rol taxativo de benefícios previdenciários, para a segurança maior dos segurados-contribuintes. Por cautela, recepcionou-se, em caráter temporário, as Leis de nº 8.212/91, de nº 8.213/91 e de nº 9.717/98 na categoria de lei complementar. Positivamente, faltou a mão do jurista na elaboração da PEC.

Analisemos resumidamente os principais aspectos da reforma pretendida.

 

2 CAPITULO I – DAS ALTERAÇÕES NA CONSTITUIÇÃO

Art. 22 da CF:

O inciso XXI amplia a competência da União incluindo normas gerais sobre inatividades e pensões das polícias militares e dos corpos de bombeiros militares.

 

Art. 37 da CF:

         O § 10 veda a percepção simultânea de proventos de aposentadoria do regime próprio de previdência social dos servidores, de proventos de inatividades de que tratam os arts. 42 e 142 e de proventos do RGPS, com a remuneração de cargo, emprego ou função pública, ressalvados os cargos acumuláveis na forma prevista na Constituição, os cargos eletivos e os cargos em comissão.

O § 13 cuida de matéria concernente à readaptação do titular de cargo efetivo para exercício de cargo, cujas atribuições e responsabilidades sejam compatíveis com a limitação que tenha sofrido em sua capacidade física ou mental. A norma, além de não se revestir de natureza constitucional não tem implicância direta com a previdência social.

 

Art. 38 da CF:

         O inciso V recebe nova redação sem alterar em nada o seu sentido expresso na redação original. Trata-se de simples preferência de linguagem.

 

Art. 39 da CF:

Mediante introdução do § 9º ao art. 39 da CF submetem os servidores públicos ao regime de que tratam os arts. 40, 201 e 202 da CF, observadas as condições neles estabelecidas, vedada outra forma de proteção, inclusive, por meio de pagamento direto de complementação de aposentadorias e de pensões.

 

Art. 40 da CF:

Mediante nova redação a ser conferida, os servidores exercentes de cargos efetivos da União, Estados, DF e Municípios, incluídas suas entidades autárquicas e suas fundações públicas, é assegurado o regime próprio de previdência social de caráter contributivo e solidário por meio de contribuição do respectivo ente federativo, dos servidores ativos e inativos e pensionistas, observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo, nos § 1º, § 1º -A, § 1º- C e § 1º-D do art. 149 e art. 249 da Constituição. Os parágrafos do art. 149 são aqueles acrescentados pela PEC, que criam alíquotas progressivas e contribuições extraordinárias, mais adiante analisadas. Há aparente conflito com o § 9º, do art. 39, mas este parágrafo se refere aos servidores públicos em geral e não aos servidores efetivos. Não há, portanto, a desejada fusão dos regimes previdenciários, público e privado.

O § 1º prescreve que a lei complementar de iniciativa do Poder Executivo Federal disporá sobre normas gerais de organização, de funcionamento e de responsabilidade previdenciária na gestão dos regimes próprios de previdência social, dentre outras coisas, estabelecendo quanto ao rol taxativo de benefícios; requisitos para sua instituição e a sua extinção; forma de apuração da base de cálculo e definição de alíquotas das contribuições; condições para instituição do fundo com a finalidade previdenciária de que trata o art. 249; medidas de prevenção, identificação e tratamento de riscos atuariais; mecanismo de equacionamento do déficit atuarial e de eventual superávit; estruturação, organização e natureza jurídica da entidade gestora do regime; e condições e hipóteses para responsabilização daqueles que desempenham atribuições relacionadas, direta ou indiretamente, com gestão do regime. O rol de benefícios previdenciários deveria figurar no texto constitucional para a garantia do contribuinte da previdência.

O § 2º prescreve que os servidores públicos abrangidos pelo caput desse artigo serão aposentados, observado o disposto na lei complementar referida no § 1º retro examinado de forma sucinta:

I – voluntariamente, desde que observados a idade mínima e os demais requisitos previstos na nova lei complementar referida no § 1º;

II – por incapacidade permanente, para o trabalho, quando insusceptível de readaptação, seguido de exames e avaliações periódicas;

III – compulsoriamente, ao atingir a idade máxima prevista na nova lei complementar.

O § 3º versa sobre ajustamento das idades mínimas para concessão de benefícios previdenciários quando houver aumento de expectativa de sobrevida da população brasileira, na forma estabelecida para o RGPS.

O § 4º veda proventos de aposentadoria inferior ao valor do salário-mínimo ou superior ao limite máximo estabelecido para o RGPS, observados os dispostos nos § 14, 15 e 16 do art. 40. (§ 14 e 15 com redações conferidas pela PEC).

O § 5º flexibiliza a concessão e manutenção de pensão por morte em termos vagos, o que gera insegurança jurídica. Se os requisitos forem aqueles previstos no RGPS a norma seria desnecessária.

O § 6º torna obrigatória para os entes políticos a instituição para o regime próprio de previdência social do sistema de capitalização individual a que se refere o art. 201-A acrescido pela PEC, no prazo e nos termos da lei complementar.

O § 7º prescreve meios de comprovação do equilíbrio financeiro e atuarial que é o fundamento da previdência social referida no caput. Tem por fim prevenir o desequilíbrio entre a receita e a despesa.

O § 8º prevê concessão de abono de permanência para o servidor público efetivo que opte por permanecer na atividade após preencher as exigências para a aposentadoria voluntária, no valor equivalente, no máximo, ao valor da sua contribuição previdenciária, até completar a idade para sua aposentadoria compulsória.

O § 9º permite a contagem do tempo de contribuição federal, estadual, distrital ou municipal para fins de aposentadoria, inclusive, para fins de contagem recíproca entre os dois regimes previdenciários. Outrossim, permite-se contar o tempo de serviço militar.

O § 13 prescreve a aplicação do RGPS para os exercentes de cargos em comissão, de cargo temporário e detentores de mandato eletivo.

O § 14 determina que os entes políticos instituam regime de previdência complementar para servidores públicos ocupantes de cargo efetivo, observado o limite máximo dos benefícios do RGPS para o valor das aposentadorias e das pensões no regime próprio de previdência social, ressalvada a livre opção do servidor.

O § 15 traça linhas gerais do regime de previdência complementar a que alude o parágrafo anterior, a ser detalhado por lei complementar.

O § 17 veda a existência de mais de um regime próprio de previdência social para os servidores efetivos, bem como de mais de uma entidade gestora desse regime em cada ente federativo, abrangidos todos os poderes, os órgãos e as entidades autárquicas e fundacionais.

 

Art. 42 da CF:

         O § 1º estende aos militares dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios as proibições e prerrogativas próprias de integrantes das Forças Armadas.

O § 2º está abundando, pois, repete disposição do inciso XXI do art. 22 na redação conferida pela PEC sob exame.

O § 3º faculta à lei do respectivo ente federativo dispor sobre as condições para o militar da reserva exercer atividades civis em qualquer órgão do respectivo ente federativo, bem como, estabelecer requisitos para o ingresso de militares temporários. Na realidade, essa norma não tem natureza previdenciária, relacionada que está apenas com as possibilidades de aproveitamento do militar da reserva nos órgãos da administração pública. Aliás, na prática, esse aproveitamento já está ocorrendo independentemente da aprovação desta PEC.

 

Art. 109 da CF:

O inciso I, bem como os parágrafos 2º, 3º alterados pela PEC e o § 6º por ela acrescido limitam-se a alterar a competência da Justiça Federal e nada têm a ver com a matéria previdenciária.

 

Art. 149 da CF:

O § 1º prescreve que os entes políticos instituam, observados os parâmetros previstos na lei complementar referida no § 1º, do art. 40, contribuições ordinárias e extraordinárias, cobradas dos servidores públicos, dos aposentados e dos pensionistas para o custeio do regime próprio de previdência social de que trata o art. 40. Os aposentados e pensionistas já pagam essas contribuições desde o advento da Emenda 41/2003, sem receber qualquer contrapartida de benefícios. Agora, pretende-se cobrar deles uma contribuição extraordinária – imposto inominado seria o termo adequado – nas condições previstas nos §§ 1º-A, 1º-B, 1º-C, e § 1º-D. O § 1º-A prevê a progressividade das alíquotas de acordo com a base de cálculo de contribuição ou do benefício recebido. Os §§ 1º-C e 1º-D regulam a contribuição extraordinária para a hipótese de déficit atuarial que incide sobre os benefícios a partir do valor do salário-mínimo durante vinte anos.    A inclusão de semelhante norma é uma confissão antecipada da incompetência administrativa na gestão do sistema previdenciária jogando os ônus dessa incapacidade gerencial nas costas dos servidores públicos, dos aposentados e dos pensionistas. A PEC em discussão já prevê mecanismos de aumento do limite de idade para fruição de aposentadoria em função do aumento da expectativa de sobrevida da população, de sorte, que não faz sentido falar-se em déficit atuarial. Se a moda pegar no âmbito do direito tributário teremos impostos extraordinários fora dos parâmetros atuais do inciso II, do art. 154 da CF. Se for para agravar a tributação, sempre que houver déficit, não faria diferença o povo eleger um estadista ou um curioso para governar este País. Aliás, tributação exacerbada é sinônima de incompetência e de corrupção administrativa. Desde o ano de 1994, até 31 de dezembro de 2015, os recursos da previdência social vinham sendo subtraídos em 20% todos os meses, por conta de sucessivas Emendas Constitucionais com o nome de FSE, de FEF e depois por um fundo sem nome, conhecido pela sigla DRU. A sangria só terminou com o advento da EC nº 93/16 que prorrogou a DRU até o final do exercício de 2023, aumentando o percentual de desvinculação das receitas de União de 20% para 30%, porém, poupando os recursos da previdência social. Não é o caso de o Tesouro da União repor os recursos desviados da previdência social? A outra sangria aos cofres da previdência é representada pela substituição provisória da contribuição sobre a folha pela contribuição sobre a receita bruta – CPRB – relativamente a milhares de contribuintes. Ao invés da substituição por setores da economia, como determina o texto constitucional (§§ 12 e 13 do art. 195 da CF), o governo implementou a substituição por produtos, tornando bastante complexa a legislação, aumentando o custo operacional das empresas que devem acompanhar as constantes inclusões e exclusões de seus produtos no regime substitutivo, por meio de uma legislação dinâmica e caótica. Finalmente, os aposentados e pensionistas não são os responsáveis pelo fabuloso déficit público acumulado, no valor de R$ 195,2 bilhões informado na exposição de motivos que acompanhou a PEC nº 6/19. O que a proposta de reforma deixa entrever, nesse particular, é a mensagem de que os aposentados e os pensionistas vivem mais do que a expectativa de sobrevida, causando o chamado déficit atuarial a ser por eles coberto pelo prazo de vinte anos. O segredo para diminuir o déficit é cortar as despesas e conter os desvios, ou seja, cumprir a LOA e a LRF.  É tão simples que ninguém se dispõe a colocar em prática.

O § 5º versa sobre inaplicação da imunidade sobre receitas de exportação relativamente à CPRB. O melhor seria devolver à previdência social a inteireza da contribuição social que lhe é própria, mediante uma definição clara dos instrumentos de desenvolvimento econômico, ao invés de ficar dando uma martelada no casco e outra na ferradura.

 

Art. 167 da CF:

O inciso VI, do parágrafo único do art. 194 da CF, mediante nova redação conferida, prescreveu a diversidade da base de financiamento da seguridade social com segregação contábil do orçamento da seguridade social nas ações de saúde, previdência e assistência social, preservado o caráter contributivo da previdência social.

Trata-se de um avanço em termos de transparência e de controle e fiscalização das receitas e despesas previdenciárias. Considerando que a previdência social é a única que integra a seguridade social e tem caráter contributivo seria melhor que fosse dotada de orçamento próprio, separado da saúde e da assistência social que são custeadas exclusivamente com recursos provenientes de impostos em geral, vale dizer, pela sociedade como um todo.

O § 5º do art. 195 recebeu nova redação assim redigido:

 

“Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido por ato administrativo, lei ou decisão judicial, sem a correspondente fonte de custeio total”.

 

Confundiu-se o plano da legislação com o plano da aplicação da lei, cabente à administração e ao Poder Judiciário, este, em caráter definitivo.

A proibição deve estar voltada exclusivamente ao legislador como no texto em vigor, nunca ao aplicador da lei. O Judiciário interpreta e aplica a lei, negando ou concedendo o benefício previdenciário pleiteado. A proibição aventada fere a cláusula pétrea referente ao acesso universal à jurisdição. Certamente esse parágrafo 5º, se mantido, será considerado inconstitucional pelo STF.

A alteração do § 8º e acréscimos de §§ 8º-A e 8º-B ao art. 195 da CF pela PEC sob exame exacerbam o encargo previdenciário dos produtores rurais. O § 8º introduz o valor mínimo da comercialização da produção rural a ser fixada em lei, sobre a qual incide a contribuição previdenciária. O § 8º-A, por sua vez, prescreve que no caso de não haver comercialização ou não atingir o valor mínimo a que se refere o § 8º, o produtor deverá recolher o valor integral ou a diferença, como condição para a manutenção da qualidade de segurado no RGPS, para cômputo do tempo de contribuição e carência do segurado e de seu grupo familiar, conforme dispuser a lei. O § 8º-B prevê para o trabalhador rural que não seja proprietário ou possuidor (§ 8º), que exerça sua atividade individual, com ou sem relação de emprego, a contribuição com base no valor do salário de contribuição referida no inciso II, do art. 195 da CF, sem prejuízo da contribuição do empregador de que trata a alínea a do inciso I, do art. 195 da CF. O tratamento dispensado ao produtor rural viola ostensivamente o princípio da isonomia, podendo ser questionado em juízo.

O novo § 11 amplia as restrições do atual dispositivo que veda a concessão de remissão ou anistia das contribuições previdenciárias, inserindo normas casuísticas que não se revestem de natureza constitucional, contribuindo para aumentar a complexidade da Constituição. Na mesma linha segue o § 11-A. O próprio § 11 na redação atual deveria ser extirpado do Texto Magno, por incursionar na área do direito financeiro.

O § 14 passa a exigir do segurado a contribuição mínima mensal exigida para sua categoria, como condição para ser reconhecida como tempo de contribuição ao RGPS. Essa regra é flexibilizada pelo § 15 nos termos aí indicados (complementação da contribuição e agrupamento das contribuições inferiores ao limite mínimo de diferentes competências). A norma é justa e coerente, eliminando a discricionariedade de cada segurado para definir a base de cálculo da contribuição social, bem como, o momento de sua alteração, como vem acontecendo no regime vigente.

 

Art. 201 da CF:

O novo art. 201 proposto mantêm os benefícios previstos nos incisos I a V, porém, com ligeiras ampliações.

O seu § 1º submete à lei complementar de iniciativa do Poder Executivo a definição de critérios e parâmetros do RGPS com referência às matérias mencionadas nos incisos I a VIII que envolve, dentre outros aspectos, a definição do rol taxativo dos benefícios e dos beneficiários; as regras de cálculo e de reajustamento dos benefícios; regras e condições para acumulação de benefícios. O rol de benefícios deveria estar contido unicamente no texto constitucional para a garantia do segurado que pode vir a ser surpreendido com a supressão de um ou outro benefício ao longo do tempo.

A vedação do § 3º (contagem do tempo fictício) harmoniza-se com norma de idêntico teor que já consta em relação à previdência pública.

O § 4º repete a mesma disposição inserida em inúmeros outros preceitos submetendo, inocuamente, à lei complementar a tarefa de estabelecer critérios pelos quais a idade mínima será majorada quando houver aumento na expectativa de sobrevida da população brasileira. O legislador que não tem a bola de cristal deverá elevar essa idade mínima se e quando os órgãos competentes anunciarem o aumento de expectativa da sobrevida da população em geral.

O § 7º delega à lei complementar a fixação de idade mínima e tempo de contribuição distintos da regra geral para os deficientes, os trabalhadores em atividades nocivas à saúde, os professores do ensino infantil e do ensino fundamental e médio, além de trabalhadores rurais referidos nos §§ 8º e 8º-B, do art. 195, antes examinado.

O § 7º-A assegura aos trabalhadores rurais referidos no § 8º (proprietários ou possuidores, extrativista e o pescador artesanal e seus familiares que exercem atividades em regime familiar, sem empregados permanentes) um benefício no valor de um salário-mínimo, observadas as regras e exceções definidas em lei complementar. O acréscimo de art. 7º-A no bojo de um projeto, ao invés do art. 8º seguido de renumeração dos demais parágrafos revela falta de técnica legislativa.

O § 8º cuida da aposentadoria compulsória de empregados dos consórcios públicos, das empresas públicas, das sociedades de economia mista e subsidiárias.

O § 9º mantêm a contagem recíproca do tempo de serviço no RGPS e no regime próprio dos servidores, bem como a compensação financeira de acordo com critérios previstos em lei.

O § 9º-A assegura a contagem recíproca, para fins de inatividade militar ou aposentadoria, do tempo de serviço militar exercido nas atividades de que tratam os arts. 42, 142 e 143 (membros das policias militares, dos corpos de bombeiros militares; das forças armadas e os que prestam serviço militar obrigatório) e do tempo de contribuição ao RGPS, ou aos regimes próprios de previdência social. Aqui houve confusão entre serviço militar obrigatório com serviços de militares exercentes de profissões próprias, hipótese em que a contagem do tempo de serviço não poderia ser excluída, independentemente, de previsão a que alude a proposta de Emenda, sob pena de inconstitucionalidade.

O § 10 faculta à lei complementar disciplinar a cobertura de benefícios de riscos não programados, inclusive, os de acidentes de trabalho, a ser atendida concorrentemente pelo RGPS e pelo setor privado.

 

Art. 201-A da CF:

A PEC acrescenta o art. 201-A prevendo a instituição, por lei complementar, de um novo regime de previdência social, organizado com base em sistema de capitalização, na modalidade de contribuição definida, de caráter obrigatório para quem aderir, com previsão de conta vinculada para cada trabalhador.

Esse novo regime previdenciário será melhor analisado por ocasião dos comentários ao art. 115 do ADCT.

 

Art. 203 da CF:

A PEC promove alterações no art. 203 da CF inserido na Seção III, do Capítulo I, do Título VIII concernente à Assistência Social que nada tem a ver com a Previdência Social, salvo o fato de integrar o orçamento da Seguridade Social que abrange, também a Saúde e a Assistência Social. A Assistência Social destinada a atender pessoas carentes é promovida exclusivamente com os recursos financeiros de União, vale dizer, com o produto da arrecadação de impostos, ao passo que a Previdência Social reveste-se de caráter contributivo em relação a seus beneficiários.

A fixação nas regras de transição (capítulo VII), até que entre em vigor a nova lei referida no inciso VI do art. 203 da CF, de uma renda mensal de R$ 400,00 ao idoso que comprove a condição de miserabilidade a partir dos sessenta anos de idade, inferior ao salário-mínimo previsto no atual inciso V, do art. 203, já está despertando resistências no Congresso Nacional, podendo atrasar a tramitação da PEC, por conta de introdução dessa matéria estranha ao âmbito de Previdência Social. O certo seria suprimir do inciso V em vigor a referência a um salário-mínimo remetendo à lei complementar a fixação do valor do benefício mensal.

Voltaremos ao assunto, mais adiante, quando formos abordar as disposições transitórias.

 

Art. 239 da CF:

A PEC sob análise promove alterações nos §§ 1º e 3º e acrescenta os §§ 3º-A e 3º-B com relação à destinação do produto de arrecadação do PIS criado pela Lei Complementar nº 7/70 e do PASEP criado pela Lei Complementar nº 8/70.  Redirecionou-se o mínimo de 28% desses recursos para o financiamento dos programas de desenvolvimento econômico por meio do BNDES. Versam, portanto, sobre matéria inserida no Título IX da CF concernente às Disposições Constitucionais Gerais, no caso, voltadas especificamente para os campos do desenvolvimento econômico e da assistência social. É o costumeiro desvio de recursos vinculados por meio de Emendas. O inciso IV do art. 167 da CF atua em sentido contrário: excepciona com frequência o princípio que veda a vinculação de receitas de impostos a órgãos, fundos e despesas.

 

Art. 251 da CF:

É acrescentado o art. 251 versando sobre a instituição pela União do sistema integrado de dados relativos aos regimes de previdência de que tratam os artigos 40, 201 e 202, aos programas de assistência social de que trata o art. 203, e no que couber, aos proventos de inatividade e pensão por morte decorrente das atividades militares de que tratam os artigos 42 e 142. O parágrafo único determina que as entidades políticas disponibilizem as informações necessárias para estruturação do sistema integrado de dados a que terão acesso.

A norma é bastante salutar por conferir transparência no cumprimento das disposições constitucionais, facilitando o controle e fiscalização dos gastos, aumentando a eficiência na gestão pública. Na esfera tributária essa integração de dados já existe com fundamento no inciso XXII do art. 37 da CF.

Com o desenvolvimento da inteligência artificial esse trabalho de integração de dados fica extremamente fácil de operar, poupando custos e tempo. Só para se ter uma ideia, quando o comandante do avião anuncia a decolagem, as alfândegas já recebem a transmissão de dados concernentes aos passageiros e suas bagagens com os respectivos pesos e quantidades, a fim de facilitar a seleção daquelas a serem submetidas à vistoria.

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