Erro de direito não permite a revisão do IPTU

Com a notificação do lançamento tributário opera-se a constituição definitiva do crédito tributário, dando início à fluência do prazo prescricional para a sua cobrança.

O lançamento do IPTU rege-se pela modalidade de lançamento de oficio. Uma vez notificado o contribuinte do ato de lançamento mediante envio do conhecido carnê do IPTU para pagamento parcelado ou em parcela única tem-se por definitivamente constituído o lançamento que só pode ser alterado nas hipóteses do art. 145 do CTN:

“Art. 145. O lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo só pode ser alterado em virtude de:

I – impugnação do sujeito passivo;

II – recurso de ofício;

III – iniciativa de ofício da autoridade administrativa, nos casos previstos no artigo149.”

A hipótese mais comum é a do inciso I, concernente à impugnação do sujeito passivo. Apresentada a impugnação suspende-se a exigibilidade do crédito tributário enquanto perdurar a discussão administrativa do lançamento, mas não se suspende o prazo prescricional, pelo que a Fazenda deve proferir decisão definitiva antes dos cinco anos, sob pena de prescrição que opera a extinção do crédito tributário (art. 156, V, do CTN).

Cabe, também, a iniciativa de ofício da autoridade administrativa nas hipóteses do art. 149 do CTN:

“Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos:

I – quando a lei assim o determine;

II – quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;

III – quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;

IV – quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;

V – quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;

VI – quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;

VII – quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;

VIII – quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;

IX – quando se comprove que no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade de ato ou formalidade essencial.

Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.”

As hipóteses mais frequentes de alteração do lançamento do IPTU com base no art. 149 do CTN são as de omissão e de erro de fato.

Se na informação cadastral do imóvel contiver uma área menor do que a realmente existente, uma vez constatado esse fato, impõe-se a revisão do lançamento. Se for feita uma reforma no prédio com ampliação da área construída, ou modificação no padrão de construção e o contribuinte deixou de proceder à atualização na FAC, Ficha de Atualização Cadastral, poderá a autoridade administrativa rever o lançamento efetuado, à luz desses fatos de que tomou conhecimento somente após a constituição do crédito tributário.

Entretanto, se a autoridade administrativa incorrer em erro de direito por ocasião do lançamento, procedendo ao enquadramento errôneo no tipo de construção ou no padrão de construção, incorrendo em equívoco na valoração jurídica dos fatos, o lançamento não poderá ser modificado. Esse erro de direito só poderá ser sanado no exercício seguinte, por força do disposto no art. 146 do CTN:

“Art.146. Amodificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução.”

Mudança de critério interpretativo, na verdade, tem o mesmo efeito de modificação legislativa e, portanto, só pode ser aplicada para situações futuras, salvo nos casos de retroação benéfica.

Nesse sentido é a jurisprudência do STJ, conforme se verifica das ementas abaixo:

“Processo civil. Tributário. IPTU. Diferença no padrão de acabamento do imóvel. Revisão do lançamento. Possibilidade. Erro de fato. Caracterização. Art. 149, inciso VIII, do CTN. Recurso repetitivo julgado. Resp 1130545/RJ.

1. Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais que decidiu pela legalidade da revisão de lançamento do IPTU relativo ao exercício de 1998, com fundamento no art. 149, inciso VIII, do CTN.

2. O Tribunal a quo, ao analisar acerca da revisão de lançamento do IPTU, decidiu que “(…) razão não assiste ao apelante, pois o desacerto no cálculo do IPTU decorrente da apuração do padrão de acabamento do imóvel configura erro de fato, podendo o mesmo ser corrigido, de ofício, conforme a regra dos artigos 145 c/c 149, VIII, ambos do Código Tributário Nacional, sem que tal fato implique violação ao princípio da irretroatividade da exação (…)”.

3. Pela leitura do trecho acima, verifica-se que o lançamento original reportou-se a um padrão de acabamento diferente da realidade, o que ensejou posterior retificação dos dados, hipótese que se enquadra no disposto no artigo 149, inciso VIII, do CTN, razão pela qual conclui-se pela higidez da revisão do lançamento tributário.

4. Dessa forma, como o lançamento complementar decorreu de um verdadeiro erro de fato, qual seja, erro no padrão do acabamento do imóvel, possível a revisão do lançamento tributário (artigo 149, inciso VIII, do CTN).

5. No REsp 1130545/RJ, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Seção, julgado em 09/08/2010, DJe 22/02/2011, submetido ao Colegiado pelo regime da Lei nº 11.672/08 (Lei dos Recursos Repetitivos), que introduziu o art. 543-C do CPC, reafirmou-se o posicionamento acima exposto 6. Agravo regimental não provido” (AgRg no AREsp 30272/MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 27-10-2011).

“Processo civil. Recurso especial representativo de controvérsia. Artigo 543-C, do CPC. Tributário e processo administrativo fiscal. Lançamento tributário. IPTU. Retificação dos dados cadastrais do imóvel. Fato não conhecido por ocasião do lançamento anterior (diferença da metragem do imóvel constante do cadastro). Recadastramento. Não caracterização. Revisão do lançamento. Possibilidade. Erro de fato. Caracterização.

1. Aretificação de dados cadastrais do imóvel, após a constituição do crédito tributário, autoriza a revisão do lançamento pela autoridade administrativa (desde que não extinto o direito potestativo da Fazenda Pública pelo decurso do prazo decadencial), quando decorrer da apreciação de fato não conhecido por ocasião do lançamento anterior, ex vi do disposto no artigo 149, inciso VIII, do CTN.

2. O ato administrativo do lançamento tributário, devidamente notificado ao contribuinte, somente pode ser revisto nas hipóteses enumeradas no artigo 145, do CTN, verbis: “Art. 145. O lançamento regularmente notificado ao sujeito passivo só pode ser alterado em virtude de: I – impugnação do sujeito passivo;

II – recurso de ofício;

III – iniciativa de ofício da autoridade administrativa, nos casos previstos no artigo 149.” 3. O artigo 149, do Codex Tributário, elenca os casos em que se revela possível a revisão de ofício do lançamento tributário, quais sejam: “Art. 149. O lançamento é efetuado e revisto de ofício pela autoridade administrativa nos seguintes casos: I – quando a lei assim o determine;

II – quando a declaração não seja prestada, por quem de direito, no prazo e na forma da legislação tributária;

III – quando a pessoa legalmente obrigada, embora tenha prestado declaração nos termos do inciso anterior, deixe de atender, no prazo e na forma da legislação tributária, a pedido de esclarecimento formulado pela autoridade administrativa, recuse-se a prestá-lo ou não o preste satisfatoriamente, a juízo daquela autoridade;

IV – quando se comprove falsidade, erro ou omissão quanto a qualquer elemento definido na legislação tributária como sendo de declaração obrigatória;

V – quando se comprove omissão ou inexatidão, por parte da pessoa legalmente obrigada, no exercício da atividade a que se refere o artigo seguinte;

VI – quando se comprove ação ou omissão do sujeito passivo, ou de terceiro legalmente obrigado, que dê lugar à aplicação de penalidade pecuniária;

VII – quando se comprove que o sujeito passivo, ou terceiro em benefício daquele, agiu com dolo, fraude ou simulação;

VIII – quando deva ser apreciado fato não conhecido ou não provado por ocasião do lançamento anterior;

IX – quando se comprove que, no lançamento anterior, ocorreu fraude ou falta funcional da autoridade que o efetuou, ou omissão, pela mesma autoridade, de ato ou formalidade especial.

Parágrafo único. A revisão do lançamento só pode ser iniciada enquanto não extinto o direito da Fazenda Pública.” 4. Destarte, a revisão do lançamento tributário, como consectário do poder-dever de autotutela da Administração Tributária, somente pode ser exercido nas hipóteses do artigo 149, do CTN, observado o prazo decadencial para a constituição do crédito tributário.

5. Assim é que a revisão do lançamento tributário por erro de fato (artigo 149, inciso VIII, do CTN) reclama o desconhecimento de sua existência ou a impossibilidade de sua comprovação à época da constituição do crédito tributário.

6. Ao revés, nas hipóteses de erro de direito (equívoco na valoração jurídica dos fatos), o ato administrativo de lançamento tributário revela-se imodificável, máxime em virtude do princípio da proteção à confiança, encartado no artigo 146, do CTN, segundo o qual “a modificação introduzida, de ofício ou em conseqüência de decisão administrativa ou judicial, nos critérios jurídicos adotados pela autoridade administrativa no exercício do lançamento somente pode ser efetivada, em relação a um mesmo sujeito passivo, quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua introdução”.

7. Nesse segmento, é que a Súmula 227/TFR consolidou o entendimento de que “a mudança de critério jurídico adotado pelo Fisco não autoriza a revisão de lançamento”.

8. Adistinção entre o “erro de fato” (que autoriza a revisão do lançamento) e o “erro de direito” (hipótese que inviabiliza a revisão) é enfrentada pela doutrina, verbis: “Enquanto o “erro de fato” é um problema intranormativo, um desajuste interno na estrutura do enunciado, o “erro de direito” é vício de feição internormativa, um descompasso entre a norma geral e abstrata e a individual e concreta.

Assim constitui “erro de fato”, por exemplo, a contingência de o evento ter ocorrido no território do Município “X”, mas estar consignado como tendo acontecido no Município “Y” (erro de fato localizado no critério espacial), ou, ainda, quando a base de cálculo registrada para efeito do IPTU foi o valor do imóvel vizinho (erro de fato verificado no elemento quantitativo).

“Erro de direito”, por sua vez, está configurado, exemplificativamente, quando a autoridade administrativa, em vez de exigir o ITR do proprietário do imóvel rural, entende que o sujeito passivo pode ser o arrendatário, ou quando, ao lavrar o lançamento relativo à contribuição social incidente sobre o lucro, mal interpreta a lei, elaborando seus cálculos com base no faturamento da empresa, ou, ainda, quando a base de cálculo de certo imposto é o valor da operação, acrescido do frete, mas o agente, ao lavrar o ato de lançamento, registra apenas o valor da operação, por assim entender a previsão legal. A distinção entre ambos é sutil, mas incisiva.” (Paulo de Barros Carvalho, in “Direito Tributário – Linguagem e Método”, 2ª Ed., Ed. Noeses, São Paulo, 2008, págs. 445/446) “O erro de fato ou erro sobre o fato dar-se-ia no plano dos acontecimentos: dar por ocorrido o que não ocorreu. Valorar fato diverso daquele implicado na controvérsia ou no tema sob inspeção. O erro de direito seria, à sua vez, decorrente da escolha equivocada de um módulo normativo inservível ou não mais aplicável à regência da questão que estivesse sendo juridicamente considerada. Entre nós, os critérios jurídicos (art. 146, do CTN) reiteradamente aplicados pela Administração na feitura de lançamentos têm conteúdo de precedente obrigatório. Significa que tais critérios podem ser alterados em razão de decisão judicial ou administrativa, mas a aplicação dos novos critérios somente pode dar-se em relação aos fatos geradores posteriores à alteração.” (Sacha Calmon Navarro Coelho, in “Curso de Direito Tributário Brasileiro”, 10. ed., Ed.

Forense, Rio de Janeiro, 2009, pág. 708) “O comando dispõe sobre a apreciação de fato não conhecido ou não provado à época do lançamento anterior. Diz-se que este lançamento teria sido perpetrado com erro de fato, ou seja, defeito que não depende de interpretação normativa para sua verificação.

Frise-se que não se trata de qualquer “fato”, mas aquele que não foi considerado por puro desconhecimento de sua existência. Não é, portanto, aquele fato, já de conhecimento do Fisco, em sua inteireza, e, por reputá-lo despido de relevância, tenha-o deixado de lado, no momento do lançamento.

Se o Fisco passa, em momento ulterior, a dar a um fato conhecido uma “relevância jurídica”, a qual não lhe havia dado, em momento pretérito, não será caso de apreciação de fato novo, mas de pura modificação do critério jurídico adotado no lançamento anterior, com fulcro no artigo 146, do CTN, (…).

Neste art. 146, do CTN, prevê-se um “erro” de valoração jurídica do fato (o tal “erro de direito”), que impõe a modificação quanto a fato gerador ocorrido posteriormente à sua ocorrência. Não perca de vista, aliás, que inexiste previsão de erro de direito, entre as hipóteses do art. 149, como causa permissiva de revisão de lançamento anterior.” (Eduardo Sabbag, in “Manual de Direito Tributário”, 1ª ed., Ed. Saraiva, pág. 707)9. Incasu, restou assente na origem que: “Com relação a declaração de inexigibilidade da cobrança de IPTU progressivo relativo ao exercício de 1998, em decorrência de recadastramento, o bom direito conspira a favor dos contribuintes por duas fortes razões.

Primeira, a dívida de IPTU do exercício de 1998 para com o fisco municipal se encontra quitada, subsumindo-se na moldura de ato jurídico perfeito e acabado, desde 13.10.1998, situação não desconstituída, até o momento, por nenhuma decisão judicial.

Segunda, afigura-se impossível a revisão do lançamento no ano de 2003, ao argumento de que o imóvel em 1998 teve os dados cadastrais alterados em função do Projeto de Recadastramento Predial, depois de quitada a obrigação tributária no vencimento e dentro do exercício de 1998, pelo contribuinte, por ofensa ao disposto nos artigos 145 e 149, do Código Tribunal Nacional.

Considerando que a revisão do lançamento não se deu por erro de fato, mas, por erro de direito, visto que o recadastramento no imóvel foi posterior ao primeiro lançamento no ano de 1998, tendo baseado em dados corretos constantes do cadastro de imóveis do Município, estando o contribuinte notificado e tendo quitado, tempestivamente, o tributo, não se verifica justa causa para a pretensa cobrança de diferença referente a esse exercício.” 10. Consectariamente, verifica-se que o lançamento original reportou-se à área menor do imóvel objeto da tributação, por desconhecimento de sua real metragem, o que ensejou a posterior retificação dos dados cadastrais (e não o recadastramento do imóvel), hipótese que se enquadra no disposto no inciso VIII, do artigo 149, do Codex Tributário, razão pela qual se impõe a reforma do acórdão regional, ante a higidez da revisão do lançamento tributário.

10. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do artigo 543-C, do CPC, e da Resolução STJ 08/2008” (REsp 1130545/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Seção, DJe 22-02-2011).

Verifica-se que o Código Tributário Nacional em perfeita harmonia com o disposto no seu art. 146 não permite a revisão do lançamento de ofício fundado em erro de direito, ou seja, em erro decorrente de um fato de seu pleno conhecimento ao qual só passou a atribuir relevância jurídica em momento posterior ao lançamento efetivado. O que enseja a revisão é apenas a desconsideração jurídica do fato que não era do conhecimento da autoridade administrativa tributária, geralmente, por omissão do contribuinte.

Relacionados