ITBI. Base de cálculo na permuta

O tema é aparentemente simples, bastando que a lei municipal inclua a permuta como fato gerador da obrigação tributária para fazer incidir a regra geral, segundo a qual a base de cálculo é o valor venal dos imóveis permutados.

Permuta de imóveis significa troca de imóveis. Logo, haverá sempre uma dupla transmissão de propriedade imobiliária a exigir o duplo pagamento do ITBI. Não serve para fins do ITBI o conceito de permuta dado pela IN nº 107/88 da Receita Federal para o efeito de imposto de renda. Inexistindo torna, diferença paga por uma das partes, não haverá tributação de ganho de capital.

Existindo diferença de valores entre os dois imóveis, mas sem a torna caracterizada estará à incidência do ITCMD sobre a diferença não paga. Nesse sentido é a Ementa abaixo:

“Decisão: Trata-se de agravo de instrumento contra decisão de inadmissibilidade de recurso extraordinário que impugna acórdão assim ementado: “Agravo de Instrumento. Partilha em Separação Judicial. Dependendo da expedição de Formal de partilha do pagamento prévio de todos os tributos pertinentes, ex-vi do disposto no § 2º do artigo 1.031 do CPC é competente o Juízo de Família e não o da Fazenda pública para decidir questões sobre incidência dos referidos tributos. A partilha desigual dos bens do casal, cabendo a um dele um quinhão maior do que sua meação, sem o pagamento de uma contraprestação, caracteriza uma dação e não uma permuta, incidindo Imposto de Doação, estadual, sobre a diferença, não havendo incidência do Imposto de Transmissão de Bens Imóveis – ITBI, municipal, face à ausência de onerosidade. Conhecimento e desprovimento do Agravo”. (fl. 53) No recurso extraordinário, interposto com fundamento no artigo 102, III, “a”, da Constituição Federal, aponta-se violação ao artigo 5º, XXXV e LV; e 93, IX, do texto constitucional. Discute-se, no caso a incidência de ITBI sobre partilha efetuada em processo de separação judicial. Decido. A pretensão recursal não merece prosperar. O acórdão recorrido decidiu o seguinte: “Conforme ficou apurado, o quinhão do cônjuge varão foi maior que o do cônjuge mulher, o que caracterizou uma liberalidade, em vista da não ocorrência de compensação financeira na partilha, ocorrendo assim o fato gerador do Imposto de Doação (…)”. (fl. 57) Dessa forma, a controvérsia cinge-se a saber se houve ou não a doação, razão pela qual a impugnação possui índole infraconstitucional e sua revisão, por esta via, mostra-se inviável, pois a ofensa constitucional, se existente, dar-se-ia de maneira reflexa ou indireta. Destaco, a propósito, o RE-AgR 548.959, de minha relatoria, DJe 20.3.2012, cuja ementa dispõe: “Agravo regimental em recurso extraordinário. 2. Tributário. ITBI. Incidência sobre a transmissão de imóvel entre cônjuges, em razão da partilha de bens decorrente de divórcio. Controvérsia infraconstitucional. 3. Agravo regimental a que se nega provimento”. Ademais, verifico que, para se entender de forma diversa do acórdão recorrido, faz-se imprescindível a análise do acervo fático-probatório dos autos, providência vedada na via do apelo extremo (Enunciado 279 da Súmula do STF). Ademais, em questão de ordem acolhida no julgamento do AI 791.292, DJe 13.8.2010, de minha relatoria, firmou-se o entendimento de que a decisão de tribunal inferior que nega provimento a apelo, desde que fundamentada, não configura violação à garantia constitucional da prestação jurisdicional: “Questão de ordem. Agravo de Instrumento. Conversão em recurso extraordinário (CPC, art. 544, §§ 3° e 4°). 2. Alegação de ofensa aos incisos XXXV e LX do art. 5º e ao inciso IX do art. 93 da Constituição Federal. Inocorrência. 3. O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão. 4. Questão de ordem acolhida para reconhecer a repercussão geral, reafirmar a jurisprudência do Tribunal, negar provimento ao recurso e autorizar a adoção dos procedimentos relacionados à repercussão geral”. Ante o exposto, nego seguimento ao recurso (arts. 21, §1º, do RISTF e 557, caput, do CPC). Publique-se. Int.. Brasília, 12 de junho de 2013. Ministro Gilmar Mendes Relator Documento assinado digitalmente.” (AI 761669, Relator (a): Min. Gilmar Mendes, julgado em 12-06-2013, publicado em DJe-117) .

A contrario sensu, se houver torna, haverá incidência do ITBI, mas não pela diferença, como se poderia supor, porém, sobre o valor venal de cada um dos imóveis em razão da dupla ocorrência do fato gerador do ITBI.

A coisa se complica quando um proprietário de terreno transfere ao incorporador uma parte ideal desse terreno recebendo em troca quantidade determinada de unidades autônomas construídas pelo incorporador na parte do terreno que não foi objeto de transferência. No caso houve permuta de parte ideal de terreno com a prestação do serviço de construção civil. Nessa hipótese, o ITBI deve ser tributado apenas pela transferência da parte ideal ao terreno, com exclusão do valor das unidades autônomas que devem sofrer tributação pelo ISS. Na prática, vários municípios vêm promovendo uma interpretação equivocado desse tipo de contrato de permuta tributando pelo ITBI, tanto a transmissão da parte ideal do terreno, como também, as unidades autônomas considerando a ocorrência de duplo fato gerador do ITBI, desconsiderando-se a incidência do ISS na construção civil, cujo sujeito passivo é a incorporadora. A tese, entretanto, não é pacífica sendo certo que existem vários julgados do TJESP pela dupla tributação, a da transmissão da parte ideal do terreno e a da transmissão de unidades autônomas. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais vem decidindo em sentido contrário, isto é, tributação pelo ITBI da transmissão da parte ideal do terreno e a tributação pelo ISS em relação à construção civil. A tese da dupla tributação pelo ITBI implica separar o terreno da benfeitoria. Na hipótese de dupla tributação pelo ITBI a base de cálculo do imposto não poderá incluir o valor do terreno que não foi objeto de transmissão de propriedade.

Outro caso bastante controvertido diz respeito à dissolução de condomínio. Por exemplo, quatro condôminos resolvem dissolver o condomínio existente sobre quatro imóveis. Cada um deles tem 25% de cada imóvel. Com a dissolução do condomínio por meio de permutas recíprocas cada um deles ficará como único titular de domínio de cada um dos quatro imóveis.

É comum o Município tentar tributar pelo valor venal total de cada um desses imóveis.

Ora, resta claro que no caso cada um dos condôminos transmitiu 75% de cada imóvel, pois os 25% já pertencia a eles individualmente.

Logo, a base de cálculo do ITBI deve ser o equivalente a 75% do valor venal de cada imóvel transmitido por permuta.

Nesse sentido é a ementa do Acórdão abaixo transcrito:

“EMENTA

PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. OMISSÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ITBI. IMÓVEIS URBANOS EDIFICADOS. DISSOLUÇÃO DE CONDOMÍNIO. INCIDÊNCIA DO TRIBUTO. BASE DE CÁLCULO. PARCELA ADQUIRIDA AOS OUTROS COPROPRIETÁRIOS.

1. Hipótese em que os quatro impetrantes (ora recorridos) eram coproprietários de seis imóveis urbanos edificados. Os condôminos resolveram extinguir parcialmente a copropriedade. Para isso, cada impetrante passou a ser único titular de um dos seis imóveis. Quanto aos dois bens restantes, manteve-se o condomínio. Discute-se a tributação municipal sobre essa operação.

2. O Tribunal de origem entendeu ter ocorrido simples dissolução de condomínio relativo a uma universalidade de bens, conforme o art. 631 do CC/1916. Assim, não teria havido transmissão de propriedade com relação à maior parte da operação. Se o indivíduo passou a ser proprietário de imóvel em valor idêntico à sua cota ideal no condomínio, não incidiria o ITBI.

3. Inexiste omissão no acórdão recorrido, que julgou a lide e fundamentou adequadamente seu acórdão.

4. No entanto, o art. 631 não incide na hipótese, pois se refere ao caso clássico de condomínio de bem divisível. Seria aplicável se os quatro impetrantes fossem coproprietários de terreno rural ou de terreno urbano não edificado. Nesse exemplo, no caso de desfazimento do condomínio, o imóvel poderia ser fracionado junto ao cartório de imóveis, observados os limites mínimos, requisitos e formalidades legais, resultando em quatro partes iguais. Cada um dos antigos coproprietários seria o único titular de seu terreno (correspondente a 25% do original). Inexistiria transmissão onerosa de propriedade nessa situação fictícia e, portanto, incidência do tributo municipal.

5. Diferentemente, quando há condomínio de apartamento edilício, ou de um prédio urbano não fracionado em unidades autônomas, é impossível a divisão do bem. É este o caso dos autos.

6. O registro imobiliário é individualizado, como o é a propriedade de apartamentos, nos termos da Lei de Registros Públicos (art. 176, § 1º, I, da Lei 6.015/1973).

7. Na situação inicial, antes do pacto de extinção parcial do condomínio, os quatro impetrantes eram coproprietários de cada um dos imóveis, que devem ser considerados individualmente.

8. Com o acordo, cada um dos impetrantes passou a ser único proprietário de um dos seis imóveis. Ou seja, adquiriu dos outros coproprietários 75% desse bem, pois já possuía 25%.

9. O ITBI deve incidir sobre a transmissão desses 75%. Isso porque a aquisição dessa parcela se deu por alienação onerosa: compra (pagamento em dinheiro) ou permuta (cessão de parcela de outros imóveis).

10. Esse raciocínio se aplica aos quatro imóveis que passaram a ser titulados por um único proprietário. Quanto aos outros dois bens, com relação aos quais o condomínio subsistiu, não há alienação onerosa nem, portanto, incidência do ITBI.

11. Os impetrantes adjudicaram cada um dos quatro imóveis a uma única pessoa, indenizando os demais (por pagamento ou permuta), nos termos do art. 632 do CC/1916.

12. É pacífico que os impostos reais (IPTU e ITBI, em especial) referem-se aos bens autonomamente considerados. Também por essa razão seria incabível tratar diversos imóveis como universalidade para fins de tributação.

13. Esse entendimento foi consolidado pelo egrégio STF na Súmula 589: “É inconstitucional a fixação de adicional progressivo do imposto predial e territorial urbano em função do número de imóveis do contribuinte”.

14. A Suprema Corte impediu que os Municípios considerassem todos os imóveis de cada contribuinte como uma universalidade para fins de progressividade das alíquotas. Isso decorre do reconhecimento de que cada imóvel a ser tributado deve ser autonomamente considerado. 15. Se o Município não pode considerar o conjunto de imóveis uma universalidade, para cálculo do IPTU, seria inadmissível que o contribuinte possa fazê-lo com o intuito de pagar menos ITBI.

16. Recurso Especial provido.” (RESP nº 722.752 – RJ – Rel.Min. Herman Benjamin; DJe: 11-11-2009).

Como se verifica, quando se trata de permuta de imóveis há tantas incidências de ITBI quantos forem o número de transmissões imobiliárias.

Em se tratando de permuta de imóvel não edificado com prestação de serviços, o que ocorre normalmente entre o proprietário do imóvel e a incorporadora, há incidência do ITBI de um lado, e incidência do ISS de outro lado, e não dupla incidência do ITBI. Na dissolução de condomínio, para atribuir a cada condômino a titularidade de um imóvel por inteiro, deve-se deduzir da base de cálculo do ITBI o valor correspondente à parte ideal de que era titular cada um dos condôminos.

SP, 7-12-15.

* Jurista, com 30 obras publicadas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 20 (Ruy Barbosa Nogueira) da Academia Paulista de Letras Jurídicas. Acadêmico, Titular da cadeira nº 7 (Bernardo Ribeiro de Moraes) da Academia Brasileira de Direito Tributário. Acadêmico, Titular da cadeira nº 59 (Antonio de Sampaio Dória) da Academia Paulista de Direito. Sócio fundador do escritório Harada Advogados Associados. Ex-Procurador Chefe da Consultoria Jurídica do Município de São Paulo.

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